Detritos espaciais, também denominados genericamente lixo espacial, são objetos criados pelos humanos e que se encontram em órbita ao redor da Terra, mas que não desempenham mais nenhuma função útil, como por exemplo as diversas partes e dejetos de naves espaciais deixados para trás quando do seu lançamento. Tanto podem ser peças pequenas, como ferramentas e luvas — a exemplo de uma perdida por Neil Armstrong na missão Gemini VIII em 1966[2] — ou estágios de foguetes e satélites desativados[3] que congestionam o espaço em volta da Terra — como exemplo, os antigos satélites soviéticos RORSAT[4] — e que causam risco de acidentes graves, tanto em órbita (pelo risco de possíveis colisões), quanto numa possível reentrada de tais detritos na atmosfera terrestre.
Os detritos espaciais tornaram-se uma crescente preocupação nos últimos anos pelo fato de que colisões na velocidade orbital podem ser altamente danosas ao funcionamento de satélites, pondo também em risco astronautas em atividades extraveiculares; além disso, essas colisões provocam as condições para que ocorra a chamada síndrome de Kessler.
Um pouco de história
Em
1958, os
Estados Unidos lançaram o seu segundo satélite, de nome
Vanguard I, que operou durante 6 anos. Após sua desativação, este tornaria-se uma das mais antigas peças de lixo espacial.
[5] Em recente sondagem foi confirmado que a relíquia permanece em órbita, sendo portanto o detrito espacial mais antigo em órbita atualmente.
[6]
De acordo com o livro
Envisioning Information[7], do professor
Edward Tufte, a lista de lixos espaciais inclui uma luva do
astronauta Ed White, perdida na primeira
caminhada espacial norte-americana; uma
câmera que
Michael Collins perdeu próximo à
Gemini X e outra perdida por
Sunita Williams durante a
STS-116, também durante uma atividade extraveicular; sacolas de lixo; uma chave de boca e uma
escova de dente. A maioria desses objetos volta para a
Terra, atraídos pela
gravidade, em poucas
semanas. Devido às órbitas onde foram soltos e dado o seu tamanho diminuto, são facilmente deteriorados durante a reentrada na
atmosfera do
planeta. Fatos como esses não são de grande importância na problemática do lixo espacial. Por outro lado, eventuais colisões entre os objetos (que podem gerar mais peças) constituem o principal problema referente a estes detritos.
[8]
O primeiro
ônibus espacial a realizar oficialmente uma manobra evasiva de uma colisão foi o
Discovery, durante a
STS-48, em
Setembro de
1991, em que procedeu-se no acionamento de um subsistema de segurança da espaçonave para evitar a colisão com detritos de um satélite russo, Kosmos. Só a explosão causada pelo Kosmos 1813, em
1987 gerou cerca de 850 resíduos com mais de 10
cm[2] de comprimento.
Até
1998, mais de 60
janelas de ônibus espaciais haviam voltado à Terra com danos provenientes do espaço. Uma lasca de
tinta do tamanho de um grão de
sal, orbitando a uma velocidade de 14.400
km/h, pode abrir uma significante cratera de 2,5
cm de
diâmetro, com a possibilidade de a janela estilhaçar-se durante a reentrada.
[9]
Em
Outubro de
1999, a
Estação Espacial Internacional também realizou uma manobra evasiva. Os detritos consistiam em restos do foguete
Pegasus, que segundo cálculos passariam a uma distância de 1,4 km da estação. A manobra foi realizada com o acionamento do foguete do
Módulo de Controle Zarya, durante 5
segundos. Isso elevou a estação em cerca de 1,6 km e os detritos passaram a cerca de 25 km da estação.
[10] Em outubro de
2008, após mais uma manobra para evitar colisão com um detrito residual de um satélite Cosmos, a ISS já somava um total de oito manobras evasivas, sendo que as sete primeiras ocorreram nos anos inciais do programa: de Outubro de 1999 a Maio de 2003. O relatório da NASA atribui esse hiato à melhora de exatidão na vigilância espacial e rastreamento de detritos.
[11]
Durante os 10 anos de funcionamento da
estação espacial MIR, foram liberadas, em sua maioria, sacolas de lixo.
O problema dos detritos
A maior parte dos detritos espaciais se encontra em
órbita terrestre baixa, também conhecida como
LEO (do
inglês,
Low Earth Orbit); embora haja também uma quantidade considerável de detritos na órbita geossíncrona, mais conhecida como
órbita geoestacionária, a
GEO (do
inglês,
GEostationary Orbit)
[12]. Porém, esta órbita pela sua considerável distância da terra, faz com que a dispersão desses objectos seja muito maior dos que os encontrados em órbitas mais próximas. Há também cerca de 1.450 objetos cuja trajetória é excêntrica, podendo transladar pelas outras órbitas e provocar acidentes de detritos.
[9]
Estas peças orbitam a grande velocidade e poderão atingir um
satélite ou espaçonave com impacto semelhante ao de uma
balas de
fuzil.
[13] Este fato é levado em conta também no que diz respeito aos astronautas, cuja roupa de
Atividade extraveicular — O EMU (do
inglês Extravehicular Mobility Unit,
Unidade de Mobilidade Extraveicular[14]) — é concebida de forma a proteger o
astronauta[15] de micrometeoritos.
[16] Presume-se que objetos pouco maiores que meteoritos, de alguns
centímetros e alta velocidade orbital no
vácuo, sejam capazes de romper as vestes extraveiculares dos
cosmonautas, causando-lhes grandes danos.
Outra preocupação relaciona-se com a procedência dos combustíveis usados nos satélites. Tais satélites, que já não recebem ordens das centrais de comando da
Terra, podem cair a qualquer momento, atraídos pela
gravidade do planeta. Alguns desses satélites estão equipados com geradores eletro-nucleares que ativam funções específicas dentro do aparelho, e podem usar como
combustível o
urânio 235 ou o
plutônio 238
[2](ambos altamente radioativos).
Um objeto que tenha 1 mm de
comprimento seria capaz de quebrar cabos de dados e cabos de força secundários da
Estação Espacial Internacional; já um com 4 ou 5 mm já seria capaz de danificar os cabos de força principais, tubos e painéis.
[17] Por isso a
ISS é atualmente a mais protegida espaçonave a ser lançada; muitos de seus componentes externos são feitos de
alumínio. Áreas críticas, como compartimentos habitáveis, serão capazes de resistir ao impacto de detritos de 1 cm de diâmetro.
[18]
Propostas e possíveis soluções
Com o objetivo de suavizar a geração de mais lixo espacial foram propostas várias medidas. A
NASA, em
1995, foi a primeira
agência espacial a estabelecer procedimentos para a minimização dos detritos. Dois anos depois, o
governo dos
EUA desenvolveu um conjunto de Práticas Padrões para Mitigação dos Detritos Espaciais, baseado nos parâmetros da NASA. Mais tarde, outros países e organizações estabeleceram seus próprios modelos de práticas de suavização dos efeitos do lixo espacial. Em
2002 houve um consenso entre as agências espaciais de 10 países sobre o assunto. Formularam então um conjunto de linhas-de-conduta, que foi formalmente apresentado à
ONU em
fevereiro de
2003.
[12]
Uma forma de minimalização das consequências do lixo espacial sobre o meio-ambiente é a
passivação dos estágios superiores dos foguetes gastos para a liberação de combustíveis residuais, prevenindo assim futuras explosões.
Muitos componentes das astronaves são feitos de
alumínio, que tem um baixo
ponto de fusão. Como resultado, esses componentes normalmente se desintegram em grandes
altitudes, logo no início da reentrada. Por outro lado, se um componente é feito de materiais com pontos de fusão mais altos (como
titânio,
aço inoxidável e
berílio), o objeto se deteriorará a uma altitude mais próxima do solo ou, em muitos casos, pode chegar ao solo sem se desintegrar ou mesmo quase intacto, como aconteceu com o tanque combustível do
Delta II[19]. Alguns objetos têm ainda uma proteção exterior que retarda a deterioração do objeto interior, causada pelo
atrito com o ar, na reentrada na atmosfera.
Trazer os detritos de volta para a Terra pode parecer um método de "coleta" do lixo espacial eficiente, já que após a reentrada, os objetos são destruídos. Isto pode ocorrer tanto por uma queda orbital (reentrada não-controlada), como por entrada controlada. Entretanto há sempre o risco de permanecerem ainda algumas partículas, ou mesmo peças inteiras, dos objetos que entraram em combustão na atmosfera, não havendo garantia de que sua queda ocorra nas porções desabitadas do planeta. A reentrada controlada, normalmente, utiliza grande quantidade de combustível
propelente para ajustar a espaçonave ao
ângulo correto para reentrada no planeta. Geralmente utiliza-se o oceano como ponto de queda desses detritos.
[12]
Tirar os satélites de órbita logo no final de suas vidas operacionais também seria uma efetiva medida de mitigação. Isso poderia ser facilitado por um mecanismo, conhecido em inglês como
"terminator tether", onde um "cabo" eletrodinâmico, (extremamente longo e resistente, porém pouco denso) ligaria o aparato à
Terra, transmitindo a energia necessária para que o mesmo conseguisse diminuir a velocidade das espaçonaves desativadas por meio de magnetismo. Nos casos em que o sistema usado para provocar a fuga de órbita exigisse muito combustível, o
"terminator tether" poderia simplesmente alterar a órbita do satélite em questão, de forma que este pudesse realizar a fuga de rota sozinho, passados alguns anos. Essa manobra foi realizada com sucesso no satélite
francês Spot-1, no final de 2003, o que, segundo os cálculos, faria o objeto reentrar no planeta em aproximadamente 16 anos
[20] após a manobra.
Em altitudes orbitais onde não seria economicamente viável provocar a fuga de um satélite, como no anel geoestacionário, estes são levados para uma
órbita cemitério, onde não há presença de satélites em operação.
Há também propostas para "varrer" o lixo orbital de volta para a atmosfera da Terra, utilizando rebocadores automatizados, vassouras de laser para vaporizar ou amontoar as partículas em órbitas de queda rápida, ou mesmo bolhas de
aerogel para absorver detritos que colidam com essas bolhas, e, eventualmente, cair na Terra com o lixo dentro. Entretanto, a maior parte do esforço está sendo direcionado para a prevenção de colisões, acompanhando os detritos de maior largura, prevenindo a formação de mais detritos.
Outras idéias, ainda, incluem a reunião dos objetos mais largos numa espécie de "aterro orbital", onde poderiam ter alguma utilidade futura, enquanto se mantêm fora de vista.
Quantificação e qualificação
Os detritos orbitais próximos da Terra, e mais especificamente o seu número e dimensões, são estudados a partir de terra, através de radares e telescópios óticos, mas também no próprio espaço orbital, além dos dados obtidos após estudos efetuados sobre a superfície exterior das espaçonaves, quando estas retornam ao
solo.
[12]
As peças maiores são normalmente monitoradas pelas agências espaciais internacionais — tais como a
AEB, a
ESA e a
NASA —, mas as pequenas são de difícil detecção. Praticamente todos os
foguetes deixam peças e pedaços na órbita ao serem lançados, como
estágios de lançamentos abandonados, peças ejetadas, entre outros. Também existem muitos satélites que encerraram sua vida útil e continuam a orbitar a
Terra sem qualquer atividade, passando a serem considerados como lixo espacial.
[3]
As
Forças Armadas dos EUA mantêm, atualmente, um catálogo tão exaustivo quanto possível de cerca de 10.000 objetos visíveis, podendo, com estas informações, distingui-los de
mísseis hostis, por exemplo. Para isso, contam com
observações por
radar,
telescópio e um telescópio espacial.
[21] Estima-se que cerca de 330 milhões de objetos de tamanho superior a 1
mm (sendo alguns, portanto, simples partículas) se encontrem em órbita, evidenciando assim, a disparidade entre o número de objetos catalogados e a quantidade de detritos existentes.
Além das mensurações efetuadas pelas
Forças armadas estadunidenses, outras iniciativas visam quantificar e medir os detritos, como: o
Telescópio de Detritos Espaciais da Agência Espacial Européia (
ESA Space Debris Telescope), o TIRA,
[22] os radares Goldstone e Haystack
[23] e o sistema de radar Cobra Dane.
[24] Os dados obtidos durante essas campanhas serão usados para validar modelos de ambientes com detritos, tais como o ESA-MASTER.
[25] Tais modelos, hoje, são a única forma de determinar o risco de impacto causado por lixo espacial, já que apenas objetos maiores podem ser facilmente rastreados. Um exame minucioso da superfície do aparelho de Longa Duração à Exposição, mais conhecido pela sigla de
LDEF (do
inglês,
Long Duration Exposure Facility), colocado em órbita pela
STS-41-C Challenger, e resgatado pela
STS-32 Columbia após 68 meses em órbita, permitiu a análise da distribuição direcional dos detritos, bem como a composição do fluxo dos detritos.
[carece de fontes] O satélite EURECA, colocado em órbita pela
STS-46 Atlantis em
1992 e resgatado pela
STS-57 Endeavour em
1993, proporcionou melhor entendimento sobre o assunto.
Os
painéis solares do
telescópio espacial Hubble, recuperado durante as missões
STS-61 Endeavour e
STS-109 Columbia, são importantes fontes sobre o ambiente dos detritos. As
crateras encontradas na sua superfície foram quantificadas e qualificadas pela ESA para prover outros meios de validação dos modelos de ambiente de detritos.
Eventos importantes
Criação de detritos
Um estágio do foguete
Pegasus lançado em
1994 explodiu em
1996, gerando uma nuvem de 300.000 fragmentos maiores que 4 mm de comprimento. Dentre estes, 700 eram grandes o suficiente para serem catalogados. Este evento isoladamente foi capaz de dobrar o risco de colisões do
telescópio espacial Hubble .
[5]
Os testes da
Arma anti-satélite (ASAT) chinesa, em
11 de Janeiro de
2007 foi, talvez, o principal incidente histórico envolvendo detritos orbitais.
[26] Como resultado, houve a criação de mais 1.600 pedaços rastreáveis (aproximadamente do tamanho de uma bola de
golfe, ou maiores), após dois meses de o teste ter decorrido, de acordo com o Programa de Detritos Espaciais da NASA. Estima-se, também, que resultou em mais de um milhão de pedaços com 1 mm ou maiores e mais de 35.000 peças com 1 cm ou maiores. Este evento foi mais significativo que outros testes de arma anti-satélite, em que a área ocupada pelos detritos, encontrando-se num plano orbital mais distante do planeta, resultam na fuga de órbita num período de 35 anos ou mais. Em
Junho de
2007, o satélite
Terra, da NASA, foi o primeiro a alterar a sua posição, com o objetivo de prevenir impactos.
[27]
Um evento de
magnitude similar ocorreu em
19 de fevereiro de
2007, quando o estágio do
dínamo de injeção de um
Briz-M russo explodiu enquanto orbitava a
Austrália. O sistema foi lançado em
28 de fevereiro de
2006, carregando um satélite de comunicação defeituoso. A explosão foi documentada em filme por vários astrônomos, mas devido à trajetória orbital dos destroços, a nuvem de objetos em queda dificultou a quantificação destes através de radar. Muito embora semelhante em proporção, a área em que os detritos se encontram está mais próxima do planeta do que no caso do teste ASAT chinês, pelo que se verificou muitas reentradas na atmosfera em um período relativamente pequeno de tempo. Como em
21 de fevereiro de
2007, em que mais de mil fragmentos foram identificados.
[28] Um terceiro evento de impacto também ocorreu em
14 de fevereiro de
2007, como registrado por Celes Trak.
[29]
Em
20 de Fevereiro de
2008 outro ASAT foi lançado rumo a um satélite defeituoso, desta vez pelos Estados Unidos, com o objetivo de destruir o tanque de
Hidrazina tóxica do satélite
USA 193.
O Pentágono tinha o intuito de minimizar a quantidade de detritos resultantes do encontro do satélite com o míssil; esperando que os detritos entrassem na na Terra ainda nas primeiras semanas de março.
[30]
No dia
10 de fevereiro de
2009 um satélite russo desativado chocou-se contra um satélite privado de comunicações estadunidense a 780 km de altitude sobre o território da
Sibéria gerando uma nuvem de escombros. Afirmado que os detritos geradas não são riscos reais para a Estação Espacial Internacional, esta é a primeira colisão já registrada entre satélites.
[31]
Impacto de detritos
A primeira colisão averiguada com lixo espacial catalogado ocorreu em
1996, danificando seriamente o satélite de reconhecimento militar
francês Cerise.
[32] O acidente foi causado por um fragmento já catalogado de um
Ariane. Os objetos deste foguete se encontravam entre 660 km a 680 km da Terra e estavam a uma velocidade de 14.8
km/s. Destes, somente um possuía tamanho suficiente para ser rastreado.
[33]
Lottie Williams possui o recorde de ser a primeira e única pessoa (até à presente data) a ser atingida por um detrito espacial de origem humana. Enquanto caminhava num parque em
Tulsa,
Oklahoma em
22 de Janeiro de
1997, às 3:30 da manhã, notou uma luz no céu que julgou ser um
meteorito. Minutos depois, Williams foi atingida no ombro por um objeto de metal negro de 6 polegadas que, mais tarde, foi identificado como sendo parte do tanque de combustível de um foguete
Delta II, que havia lançado um satélite da
Força Aérea estadunidense em
1996. Lottie não se feriu com o incidente.
[34]
Em
maio de
2000, duas esferas metálicas caíram em
fazendas na
África do Sul. O evento foi comentado pela NASA numa rádio local, e a agência espacial estadunidense admitiu que ambos os objetos pertenciam a um foguete Delta lançado em 1996. O primeiro detrito, que pesava cerca de 30 kg, caiu na
Cidade do Cabo e contou com a presença de testemunhas. O segundo objeto, que possuía uma forma mais ovalada, pousou três dias depois do primeiro e pesava cerca de 55 kg. As testemunhas disseram que o objeto media cerca de 1,3 m de largura por 1 m de comprimento.
[35]
Notas e referências
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